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Carne Viva: O azul e o corpo na arte de Paula Boechat

Paula Boechat revela suas inspirações, a simbologia do azul em sua obra, sua trajetória artística e a exposição Carne Viva em entrevista exclusiva.

Foto da entrevistada do dia e artista visual Paula Boechat.

Paula Boechat é uma artista visual que vive e trabalha no Rio de Janeiro.

Estudou desenho e pintura na Universidade da Califórnia em 1996 e de 1997 a 2001 frequentou diversos cursos na Escola de Artes Visuais do Parque Lage e em 2000 se formou em Desenho Industrial.

Já em 2002, frequentou a l’École des Beaux Arts em Paris, onde residiu por três anos.

Desde 1998, Paula desenvolve projetos em pintura, vídeo, instalação, fotografia e performance, e ganhou o Prêmio Rio Jovem Artista da RIOARTE em 2000.

Na mesma época conheceu Gabriela Moraes, com quem formou a dupla PaulaGabriela, realizando exposições no Brasil e no exterior.

A dupla, que explorava a perda da identidade no mundo contemporâneo, suas conexões e desconexões, através de fotografias, performances e instalações, trabalhou juntas por 10 anos e recebeu diversos prêmios.

Paula Boechat já expôs seu trabalho em diversas cidades no Brasil e no exterior.

Atualmente, a artista participa com Karin Cagy da exposição Carne Viva no Centro Cultural Memorial Getúlio Vargas.

As obras apresentadas na mostra transitam entre desenhos, pinturas e instalações, e as obras de Paula Boechat exploram o corpo, o azul e a identidade em um diálogo com o patriarcado e sua vivência pessoal.

Obras de Paula Boechat na exposição Carne Viva. Crédito: Divulgação

Nesta entrevista exclusiva a artista nos explica mais de suas concepções artísticas, sua carreira e sobre suas artes apresentadas na exposição.

Victor Hugo Cavalcante: Primeiro, é um prazer recebê-la no Jornal Folk, e gostaria de começar com a seguinte pergunta: Na exposição Carne Viva, você utiliza predominantemente o azul em suas pinturas. Qual é o significado dessa cor em relação ao seu processo de reabilitação e à sua nova percepção de mundo?

Paula Boechat: De uns meses pra cá desenvolveu-se em meu cérebro um zumbido de mar, de maneira que o som de uma praia deserta (o qual já tive o prazer de escutar), se repete incessantemente.

Talvez não por acaso é um dos sons que consigo ouvir se estiver de frente para ele (o mar, a pia do banheiro, uma cachoeira), ouço bastante o som da água, e isso tem trazido muito os azuis, como se me remetessem a esses sons de água novamente, além de que é uma cor fascinante entre os azuis-claros e os azuis-escuros…

As misturas com o magenta que resultam em roxos, com o branco em lilás, enfim, é uma cor muito rica que desde os primórdios da pintura é explorada, já tendo sido considerada sagrada.

O azul é majestoso e absolutamente prazeroso de se trabalhar.

Victor Hugo Cavalcante: A exposição Carne Viva também aborda a relação entre corpo e patriarcado. Como essa temática é trabalhada em suas pinturas, especialmente considerando sua vivência pessoal?

O patriarcado é muito presente na minha vida, meu pai é nordestino, não conseguiu fazer faculdade, veio do sertão, um dos dez filhos da minha avó e o único que prosperou economicamente e sempre me apoiou nos meus estudos artísticos, e pela busca do meu sonho e carreira.

Victor Hugo Cavalcante: Como a sua experiência pessoal com a surdez influenciou as cores e as formas que você escolheu para as obras apresentadas em Carne Viva?

As minhas pinturas têm muito movimento, sempre tiveram, afinal a vida é movimento e não existimos sem ele… principalmente depois de uma doença grave, o movimento é ainda mais necessário, tornando-se vital.

Em Carne Viva meu corpo se apresenta por inteiro em movimentos e reflexões em torno da vida, isso provavelmente não será captado por todos os espectadores, pois a pintura abstrata nasceu para realmente exprimir sentimentos e paisagens intrínsecas do pintor, sem chegar a nenhuma representação.

Victor Hugo Cavalcante: A experiência de estudar na Universidade da Califórnia e l’École des Beaux Arts influenciou sua visão artística? Quais foram as principais lições que você trouxe dessas instituições?

Foram experiências generosas na minha formação artística, acreditar no meu potencial e talento foi uma delas, fui encorajada a seguir em frente por professores, etc.

Victor Hugo Cavalcante: A dupla PaulaGabriela explorou temas como a perda de identidade no mundo contemporâneo. O que motivou vocês a focarem nesse tema e como a parceria com Gabriela Moraes moldou sua trajetória artística?

A dupla é provavelmente a fase mais marcante da minha trajetória até agora, nos conhecemos na escola de arte e logo as ideias começaram a surgir, trabalhávamos a nossa imagem, que continha um “colorido” parecido, trocávamos de roupa uma com a outra e confundíamos as pessoas. (Risos)

Lá no começo da dupla, uma descoberta feita por mim na faculdade de design, na aula de geometria descritiva, mudaria nossa percepção de mundo e nos fez trabalhar incansavelmente sobre o tema das conexões entre humanos, tínhamos um enorme potencial produtivo juntas e fizemos trabalhos relevantes, que acredito ainda serão tema de exposições e pesquisas.

Victor Hugo Cavalcante: Como foi o processo de transição após o término da dupla PaulaGabriela? De que forma essa mudança impactou seu trabalho individualmente?

Como eu disse antes, nos conhecemos na escola de arte, estávamos num momento ótimo quando cada uma casou e foi para o seu lado desempenhar papéis femininos na história da humanidade, construir família, etc.

Quando pude, e tive tempo, voltei para onde parei antes da dupla, a pintura, já tão explorada e falada no universo artístico, considerada morta pela história da arte, mas arte é resistência, e me considero uma resistente da arte, e sigo pintando como forma de me movimentar no mundo.

Victor Hugo Cavalcante: O Prêmio Rio Jovem Artista em 2000 foi um marco na sua carreira. De que maneira esse reconhecimento influenciou seu desenvolvimento artístico e as oportunidades que surgiram depois?

O prêmio foi dado pela extinta instituição pública, a Rio Arte, que era da prefeitura e uma bela forma de incentivar jovens artistas.

Infelizmente, a instituição não existe mais, deixando esta bela lembrança.

Ganhar prêmios é sempre uma boa maneira de convencer ao público, e a pintura pela qual ganhei o prêmio tem realmente uma enorme carga técnica e beleza.

Victor Hugo Cavalcante: Seu trabalho aborda temas complexos e contemporâneos. Como você enxerga o papel da arte na sociedade atual, especialmente em relação à exploração de questões identitárias?

Acho que a arte consegue fazer refletir e interagir com o mundo, infelizmente, no Brasil ela não é vista como algo essencial e não é amplamente divulgada e acessível.

Apesar disso, os artistas continuam suas pesquisas em torno da identidade, assunto muito rico no Brasil, com sua história, fauna e flora.

Victor Hugo Cavalcante: O que você considera mais desafiador na criação de performances e instalações?

Quando se pinta, muitas vezes no processo, o tridimensional parece passar melhor a ideia que borbulha na cabeça, fazendo com que o espaço bidimensional da pintura muitas vezes não seja suficiente para expressar a ideia.

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