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Entrevista: Cia Dois Ventos apresenta um vendaval cultural

Confira entrevista da história da Cia que apresenta uma tempestade cultural nas periferias, trazendo arte, educação e direitos humanos aos palcos do Brasil.

Foto da entrevistada Ivone Dias Gomes, atriz e criadora da Cia Dois Ventos.

Ivone Dias Gomes é atriz, dramaturga, diretora e professora de teatro, com formação em licenciatura em teatro.

Atualmente, é pós-graduanda em Educação em Direitos Humanos na UFABC.

Além disso, é fundadora do Coletivo Njinga (2019) e realiza pesquisas sobre teatro e educação.

Priscila Ribeiro é atriz, arte-educadora, produtora, sonoplasta, cenógrafa, editora, mixadora e cineasta.

Priscila é formada pelo Centro Universitário Ítalo Brasileiro em Licenciatura em Teatro e está cursando MBA em Cinema pelo Centro Universitário Max Planck.

Em 2017 as duas atrizes se juntaram e criaram a Cia Dois Ventos.

Conheça agora nessa entrevista com Ivone Dias Gomes, um pouco mais dessa cia que não apenas apresenta espetáculos teatrais, e sim causa um verdadeiro vendaval de cultura periférica por onde passa.

Victor Hugo Cavalcante: Primeiro, é um prazer poder recebê-los no Folk, e gostaria de começar perguntando: Como surgiu a ideia de fundar a Cia. Dois Ventos e qual foi o principal objetivo ao criar o grupo?

Cia. Dois Ventos/Ivone Dias Gomes: Primeiramente agradecemos o convite.

É um prazer imenso poder contar a nossa história.

Bom, a Cia surgiu em 2017, nós duas, Ivone e Priscila estávamos cursando a faculdade de Licenciatura em teatro, já havíamos realizado alguns espetáculos no curso e começamos a observar que as nossas formas de ver o mundo através das nossas criações artísticas se entrelaçavam.

Em um determinado momento do curso criamos duas personagens construídas a partir da história de pessoas reais.

E nós duas sem combinar escolhemos duas mulheres, mães periféricas, uma era a Vera que é mãe de Priscila e a outra era a Denise, vizinha da Ivone.

Então a partir dessa pesquisa fomos nos aproximando e então um belo dia na sala de aula começamos a construção da Cia, foi muito orgânico: “Vamos montar uma companhia juntas?”.

E a partir desse momento começamos a estruturar todo nosso projeto com o maior objetivo de fazer teatro para os nossos, enfatizar que a nossa cultura pulsa é precisa ser contemplada.

Então criamos um espetáculo chamado Vizinhas com as duas personagens que são mães que vivem na favela, abordando o cotidiano, as nuances, as dificuldades e as alegrias de ser quem é.

Com esse espetáculo circulamos em muitas instituições, ONGs, Fundação Casa, universidades e teatros.

Victor Hugo Cavalcante: Como a valorização e enaltecimento da cultura das periferias se refletem nas peças de teatro que vocês produzem?

Exatamente tudo que fazemos é em prol da valorização da cultura da periferia.

Nós duas, além de atrizes, somos também arte-educadoras e em todos os projetos refletimos e pesquisamos como podemos chegar de forma leve e dinâmica nas pessoas de diversas faixas etárias, dialogando temáticas pertinentes na periferia.

Realizamos pesquisas estéticas, sonoras e até sensoriais de elementos que possam potencializar e fazer com que qualquer pessoa que assista ao espetáculo compreenda que pessoas faveladas estão ali no palco, que duas mulheres que vivem nas quebradas da zona sul estão fazendo arte, com isso os projetos possuem muitas músicas como, por exemplo: Rap, funk, samba e forró, que potencializam a nossa cultura.

Victor Hugo Cavalcante: Quais são os principais desafios enfrentados por uma companhia teatral independente como a de vocês, considerando especialmente o contexto das periferias urbanas?

Existem diversos tipos de desafios em esferas diferentes, primeiro de tudo que somos duas mulheres a frente de tudo, isso infelizmente ainda não é muito comum, existem sim outras companhias com sua maioria mulheres, mas de fato ainda é um espaço que em sua maioria são gerenciados por homens.

Bom, esse é um ponto.

Outro ponto é a desvalorização dos projetos independente, nós, por exemplo, passamos muito tempo tendo que realizar trabalhos literalmente gratuitos, tirando dinheiro do nosso bolso para poder fazer teatro.

Estamos aqui hoje porque sim: queremos muito isso daqui e sabemos que mesmo após 7 anos de trajetória, temos uma história muito bonita e consistente, porque nós sempre soubemos para quem e por que estamos trabalhando.

Essa desvalorização é principalmente orçamentária, já nos aconteceu e ainda acontece de ter possibilidade de contratação, mas as pessoas não querem pagar.

É uma situação que vemos como uma falta de consciência de que tudo isso é fruto de muito trabalho, é o nosso trabalho, nós vivemos disso, e apesar de fazer tudo com muito amor, nós somos duas mulheres de favela que precisam lutar todo dia para sobreviver com dignidade.

Não esquecendo que atualmente temos uma equipe que trabalha conosco, temos que arcar com transporte, assistência de produção, sonoplasta, iluminadora, interprete de libras, elenco e também alimentação, nós temos uma cultura dentro da Dois Ventos que é: ninguém trabalha com fome!

E isso é uma prioridade para nós.

Como podemos falar de humanidade no palco, falar de cultura, de valorização e não fortalecer, se importar com os nossos companheiros de arte?

Victor Hugo Cavalcante: Como é o processo de pesquisa e criação de uma nova peça na Cia. Dois Ventos? Vocês têm alguma abordagem específica ou método de trabalho?

Nós sempre dialogamos com as ideias e analisamos as possibilidades.

A partir de ideia inicia-se a pesquisa de referências pretas, periféricas, artigos e livros escrito por mulheres ou que se relacionem com a temática desejada.

Nesse mesmo momento de pesquisa dá início a estruturação do projeto, com a criação dos personagens e temáticas que serão envolvidas.

Nos últimos projetos, por exemplo, Preta de Neve e Pretinha Adormecida, a Ivone que realizou a pesquisa, ambos possuem dissertação sobre a temática com milhares de referências.

Nesses projetos Ivone estruturou o projeto, criou a dramaturgia e levou para sala de criação, assim a partir da leitura e questionamento a pesquisa vai criando forma, realizando os ajustes necessários.

E após esse processo, estratégias de produção, ensaios e captação de recursos são determinados para dar andamento.

Victor Hugo Cavalcante: Vocês têm algum projeto ou iniciativa em andamento que gostariam de destacar? Como os interessados podem apoiar ou participar?

Temos o projeto Rapunzel e o Orí Mágico, o qual é continuação da desconstrução dos contos de fadas.

Temos também alguns projetos audiovisuais, dentre eles temos o desejo de transformar Pretinha Adormecida em animação.

Além de produzir curtas-metragens com temáticas periféricas.

Os interessados em nos apoiar podem entrar em contatos conosco pelo nosso Instagram, podem apoiar com apoio para a criação desses projetos, apoio com materiais, patrocínios e claro, contratações dos projetos que já circulamos.

Victor Hugo Cavalcante: Em que medida a educação e os direitos humanos influenciam o trabalho da Cia. Dois Ventos? Existem parcerias ou colaborações com instituições educacionais, ou organizações de direitos humanos?

Em todas as medidas possíveis os direitos humanos influenciam nosso trabalho, todos nossos projetos possuem fundamentos, referências, dentre essas, as leis que visam direitos humanos e direitos educacionais, estão introduzidas nos nossos espetáculos.

Falar de educação e humanidade é o nosso maior objetivo.

De onde somos, eu digo somos, porque não saímos da favela, ainda vivemos nela.

Temos que escancarar nossas dores, nossas alegrias, nosso dia a dia para o mundo entender que existimos e estamos aqui para ficar e esse é a nossa maior conquista, o direito ir e vir, fazendo arte e quebrando paradigmas, sendo duas mulheres com orgulho de quem são.

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