Crédito da foto principal: Divulgação.
O trabalho doméstico e de cuidados não remunerado, realizado na maioria por mulheres, movimenta o equivalente a US$ 10,8 trilhões por ano, segundo a Oxfam International e, ainda assim, permanece invisível.
No interior dessa economia oculta, feita de tempo, corpo e silêncio, nasce O peso da inexistência, da escritora Amélia Greier: um retrato social do apagamento das figuras femininas que sustentam a vida cotidiana, mas seguem fora das estatísticas, dos cargos e do reconhecimento.
É nesse lugar não reconhecido pela sociedade que a autora posiciona a protagonista do romance: uma mulher sem nome, reduzida a papéis transitórios em meio à crise econômica e ao avanço da automação — a mãe, a esposa, a doceira, a operadora de caixa, a passeadora de cães.
Entre jornadas exaustivas, a personagem alterna trabalhos precários para manter a casa e os três filhos pequenos, enquanto o marido, engenheiro desempregado, tenta se adaptar a um mercado dominado por algoritmos.
É uma história construída a partir de gestos ordinários, como preencher um formulário, preparar o café, vender doces, mas que revelam o colapso silencioso de quem movimenta o mundo sem ser vista.
Nesse cenário de ficção, o cotidiano doméstico e a ausência de tempo para si revelam uma crítica direta à realidade da desvalorização do cuidado como forma legítima de trabalho.
A obra ainda aborda temas sensíveis como desigualdade de gênero, exploração laboral, esgotamento emocional e o impacto da tecnologia sobre as oportunidades de emprego e a dignidade humana.
Ao retratar uma mulher submetida a múltiplas funções, a autora expõe o custo humano da produtividade desenfreada e questiona as narrativas sociais que determinam quem “existe” e quem permanece ignorado.
O ponto de virada do enredo acontece quando a protagonista recebe uma proposta financeira duvidosa que coloca à prova seus valores.
A recusa, marcada pela frase “não sou qualquer pessoa”, sintetiza a resistência ética de se negar a aceitar a própria desumanização.
Assim, o desfecho desloca o sentido de identidade: a mulher finalmente compreende que seu valor não depende de títulos ou cargos, mas da própria existência em um mundo que tenta lhe apagar.
Com estrutura realista, linguagem direta e uma experiência de leitura imersiva, Amélia Greier utiliza uma prosa fluida e poética, marcada por diálogos internos que traduzem o peso da rotina e da sobrevivência de tantas mulheres brasileiras.
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