A partir de 7 de março, o artista plástico carioca Caio Truci apresenta a exposição Àwúre no Centro Cultural Correios RJ.
Àwúre, que, em yorubá, significa o ato de pedirmos a benção, retrata os orixás de diversas maneiras e faz o espectador se conectar à sua ancestralidade.
Caio Truci discute nesta entrevista o papel da arte contemporânea na reflexão sobre ancestralidade e diversidade cultural, com destaque para a importância da exposição no Centro Cultural Correios RJ.
Além disso, o artista ainda detalha o processo criativo por trás de suas obras e como buscar retratar aspectos da cultura yorubá de maneira inovadora, e também revela muito mais sobre sua carreira artística.
Victor Hugo Cavalcante: Primeiro, é um prazer poder recebê-lo no Folk, e gostaria de começar perguntando: Como você descreveria a inspiração por trás da exposição Àwúre e como ela se relaciona com sua jornada pessoal e artística?
Caio Truci: Gratidão pela oportunidade de falarmos sobre esse trabalho.
A principal inspiração por trás da mostra que estou propondo é o legado ancestral deixado pelos povos tradicionais de terreiro e pela minha vivência como iniciado na religião dos orixás no Axé Oin Omin Ilê a aproximadamente 10 anos.
Sendo assim a minha arte tem como inspiração a minha religião e a cultura Iorubá.
Victor Hugo Cavalcante: Em sua opinião, qual é o papel da arte contemporânea na reflexão sobre temas como ancestralidade, fé e religiosidade, especialmente em sociedades marcadas pela diversidade cultural como a brasileira?
Acredito que a arte de modo geral tem um papel muito importante para esclarecer diversas questões de forma educativa. E criar uma sociedade mais pensante e com o intelecto mais desenvolvido, livre de preconceito e intolerância referente a diversos temas.
Victor Hugo Cavalcante: Qual é a importância do Centro Cultural Correios RJ como espaço para a exposição Àwúre e como você vê o impacto dessa mostra no contexto cultural da cidade do Rio de Janeiro?
Penso que é de suma importância essa mostra ocorrer em um espaço tão tradicional na cidade do Rio de Janeiro.
Que proporciona essa interação com as demais instituições do corredor cultural da região.
O fato de ser uma mostra gratuita também viabiliza passar a mensagem proposta para o maior número de espectadores possível, e poder seguir com esse diálogo para um futuro mais igualitário do ponto de vista racial/religioso.
Victor Hugo Cavalcante: Como foi o processo de colaboração com o curador Carlos Bertão e o designer expográfico/iluminador Alê Teixeira na concepção e realização da exposição que se inicia no dia 07 de março?
Todo o processo da curadoria de Carlos Bertão foi de grande importância para a construção de um diálogo e a contextualização da nossa mostra.
Penso que não seria possível passar essa mensagem de Àwúre (Benção) aos espectadores que não conhecem ou que nunca tiveram uma “vivência” com a religião dos Orixás, se não fosse o trabalho desenvolvido em conjunto entre Carlos e o designer Alê Teixeira para deixar a comunicação mais clara e próxima da nossa realidade contemporânea.
Victor Hugo Cavalcante: Pode nos falar um pouco sobre o processo criativo por trás das suas obras em óleo sobre tela e óleo sobre papel apresentadas na exposição?
Atualmente, meu processo criativo se dá mediante estudos no campo geral da pintura em óleo e acrílica, por meio de referências fotográficas que possuem o povo de terreiro como protagonista, e do meu cotidiano nas funções dentro da casa de axé onde sou iniciado.
Além dessas principais fontes de inspiração, também desenvolvi algumas obras intuídas por sonhos que tive no decorrer da minha produção.
Tido essas experiências espirituais, desenvolvi duas obras que também fazem parte da mostra.
Victor Hugo Cavalcante: Quais aspectos da cultura yorubá e da diáspora africana você busca destacar em suas obras e como você os aborda de maneira inovadora?
Atualmente, busco retratar, além dos orixás, as personalidades que ao longo dos anos foram de suma importância para a preservação do culto africano no Brasil e pela resistência contra a intolerância religiosa.
Além de devolver um pouco para a sociedade em forma de arte.
Principalmente a história dessas ilustres mulheres/mães que estiveram sempre à frente do seu tempo a fim de promover a proteção de seu povo e de sua cultura.
Victor Hugo Cavalcante: Considerando sua formação em Arquitetura e Urbanismo, de que forma essa área do conhecimento influencia ou se reflete em sua prática artística?
O fato de ser arquiteto me traz uma responsabilidade ainda maior, já que além da questão cultural nosso principal papel é “criar espaços” e pensar uma cidade ainda mais inclusiva para todos.
Como artista, meu objetivo se cruza com o de arquiteto, já que também penso em conectar pessoas, credos, criar essa comunhão respeitosa através do conhecimento e da arte.
Victor Hugo Cavalcante: Além da exposição Àwúre, quais são seus próximos projetos ou áreas de interesse na sua trajetória artística?
Acredito que é apenas o início de uma boa jornada.
Como dizem nossos mais velhos na religião, “É apenas a semente que foi plantada…” e que pretendo colher em forma de um futuro mais respeitoso para todos.
Pretendo continuar na minha pesquisa, e desenvolver mais trabalhos ligados a vivência religiosa e dialogar com novas técnicas e superfícies.