No último domingo (25), foi comemorado o Dia Mundial do Implante Coclear, mas você sabe o que é esta tecnologia assistiva?
O implante coclear representa uma história de sucesso na interseção da medicina e da tecnologia, proporcionando uma nova perspectiva de vida para pessoas em todo o mundo.
Confira abaixo um pouco da história do surgimento do Implante Coclear no mundo.
História do Implante Coclear no mundo
Desde os primeiros experimentos de estimulação elétrica realizados em 1790 pelo físico italiano Alessandro Giuseppe Antonio Anastasio Volta (1745–1827) até os avanços contemporâneos, esta tecnologia revolucionou a vida de milhões de pessoas em todo o mundo.
No entanto, foi apenas em 25 de fevereiro de 1957 que os cirurgiões francos-argelinos André Djourno e Charles Eyriès realizaram o primeiro implante coclear em um paciente, marcando o início da era moderna dessa tecnologia.
Eles inseriram um único fio de cobre na cóclea de um paciente totalmente surdo, fazendo com que ele percebesse informações sonoras, embora de baixa qualidade, e que seguisse o ritmo da linguagem, porém tal implante falhou pouco tempo depois, fazendo com que Djourno o reimplantasse pela segunda vez.
Diante do novo fracasso desse implante de um único canal, Eyriès se recusou a continuar experimentando e por isso Djourno convenceu outro cirurgião brilhante da época, o Dr. Roger Maspetiol, a continuar seu trabalho a partir de 1958, quando implantou um segundo paciente.
Já em 1961, o médico otologista William Fouts House, em Los Angeles, junto ao neurocirurgião John Doyle e ao engenheiro eletrônico James Doyle, começaram a desenvolver um implante de um único canal (na verdade, cinco eletrodos com o mesmo contato).
O trabalho de House continuou em 1970, em colaboração com o ex-engenheiro da NASA, Jack Urban, e juntos, desenvolveram um implante comercial fabricado pela 3M (House/3M) que foi o primeiro implante comercial aprovado pela FDA (Administração de Alimentos e Medicamentos) para implantação apenas em adultos.
Desde então, uma série de pesquisadores e instituições em todo o mundo têm contribuído significativamente para o desenvolvimento e aprimoramento dos implantes cocleares.
Enquanto isso, no Brasil, a primeira cirurgia de IC ocorreu em outubro de 1977, no Hospital Israelense Albert Einstein, em São Paulo, realizada pelo Dr. Pedro Luiz Mangabeira-Albernaz e sua equipe.
Junto ao médico, que aprendera a técnica com o Dr. House, nos Estados Unidos, durante a 1ª Conferência Internacional de IC em fevereiro do mesmo ano, estava também o engenheiro eletrônico Dr. Chao Chi Chun, a fonoaudióloga Marlene Mangabeira Albernaz e a psicóloga Eva Ocougne.
Esta cirurgia foi a primeira da América do Sul e a segunda fora dos Estados Unidos.
A regulamentação desse procedimento no Brasil começou com a Portaria n.º 1.278, de outubro de 1999, do Ministério da Saúde, que estabelecia critérios de indicação e contraindicação do IC, além de normas para cadastramento de centros para realização do procedimento.
Em dezembro de 2014, a Portaria n.º 2776 ampliou e incorporou novos procedimentos para atenção às pessoas com deficiência auditiva no SUS, garantindo o implante bilateral e cobertura para manutenção e troca dos componentes do IC.
Além disso, a Portaria n.º 18, de junho de 2014, da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, incorporou ao Sistema único de Saúde procedimentos relacionados ao implante coclear e às próteses auditivas ancoradas ao osso.
O funcionamento do Implante Coclear
Agora que você já sabe a história, que tal conhecer um pouco mais seu funcionamento?
Quem responde um pouco sobre seu funcionamento e a sua diferença com o aparelho auditivo (AASI), é o Dr. Fernão Bevilacqua, otorrinolaringologista do Alfa Instituto de Comunicação e Audição e membro da Sociedade Brasileira de Otorrinolaringologia eda Academia Brasileira de Audiologia (APM CFM):
“O implante coclear é um aparelho de estímulo elétrico. Ele é implantado no paciente, o qual é submetido a um procedimento cirúrgico onde é colocado um componente interno que vai com o eletrodo dentro da cóclea e um componente externo que é uma antena que capta os sons e que vai transmiti-los para esse componente interno. Já o aparelho de indicação sonora individual, o aparelho comum, ele é um aparelho externo, o paciente não é submetido a nenhuma cirurgia e ele amplifica o som captado, externamente, para dentro do ouvido. Então, para pessoas que têm surdez completa, a indicação é de implante coclear. Para pessoas que têm perdas auditivas até um grau que a gente chama de severo, é utilizado o aparelho tradicional. Então, essa é a primeira diferença”.
Ele ainda responde sobre o processo de implantação de um dispositivo coclear, assim como o processo de reabilitação após a cirurgia.
“O implante coclear é um procedimento cirúrgico no qual o paciente vai para uma anestesia geral, a gente faz uma incisão atrás da orelha, onde abrimos o osso, chamado de osso temporal, a partir da mastoide e fazemos uma introdução dos eletrodos dentro da cóclea. Esse é o procedimento cirúrgico. Normalmente, nós esperamos 30 dias para ligar esse aparelho, que a gente chama de ativação. Então, só fazemos a ativação um mês depois do procedimento cirúrgico e este é o início em que a gente vai dar um estímulo elétrico no nervo com a captação do som. Ou seja, a pessoa não começa a ouvir imediatamente, ela vai tendo acesso a estímulos sonoros. Se é uma criança pequenininha, que a gente acabou de implantar uma criança que nasceu surda, por exemplo, nós fazemos os mapeamentos e os treinamentos auditivos para que aquela criança, aquele indivíduo, ela entenda que aquele estímulo que está recebendo é um estímulo sonoro e como que ele vai ser interpretado no cérebro. Se é uma pessoa mais velha, fazemos o mesmo, mas com uma terapia auditiva associada. Esses estímulos são importantes para saber que não basta ligar o implante, ele vai ter que fazer uma série de consultas que são os mapeamentos e os treinamentos auditivos”.
Transformando vidas
O implante coclear, como vimos, proporciona uma nova perspectiva de vida para pessoas em todo o mundo.
Um desses casos é o de Fábio Freitas (foto principal), que compartilha um pouco de sua vida antes de ser implantado:
“Perdi minha audição de forma gradativa, mas sempre me virei, e há quatro anos ela zerou totalmente. Me adaptei usando aplicativos de transcrição tanto na conversa ao vivo, como em áudios do WhatsApp. Mas sentia falta de ouvir músicas, sons do dia a dia, e de ouvir meu filho”.
Ele complementa que o IC não foi uma busca real até março de 2022.
“Por eu ter uma condição genética atípica (sou portador de neurofibromatose tipo 2), tenho tumores nas mastoides e tinha grandes chances de o nervo auditivo estar calcificado, assim como a cóclea. Um amigo de Brasília que tem a mesma condição me incentivou a acompanhar por lá também. Inclusive me ofereceu abrigo no primeiro momento enquanto eu fazia as consultas e exames pré-cirúrgicos”.
Fábio ainda revela sobre o seu processo de adaptação após a cirurgia e seus motivos:
“O primeiro desafio foi ficar 35 dias há mais de 1000 km de distância. Eu sou do Rio de Janeiro, e operei em Brasília. Cheguei a buscar opções mais próximas, mas ao avaliar os riscos, recebi negativas tanto no Rio como em São Paulo”.
“Minha motivação maior a princípio era exatamente minha família, pois queria voltar a confraternizar com sons. Quando perdi minha audição, meu filho só balbuciava. Queria ter uma conversa ‘mano a mano’ com ele”.
Quanto a momentos gratificantes, Fábio cita muitos:
“Uma equipe maravilhosa, um médico que se surpreende com o resultado, luta pelo resultado, pois uma cirurgia de IC leva normalmente menos de 2h e a minha passou de 4h devido à dificuldade”.
Segundo Fábio Freitas, o Dr. Fayes Bahmad foi guiado por anjos naquele momento.
“Tanto que, no pós-cirúrgico, ele convidou minha esposa para orar, agradecendo pela condução. Houve muitos outros momentos gratificantes, como a ajuda do meu amigo Lucas, que me deu suporte moral tão longe de casa. As pessoas que colaboraram na vaquinha que precisei fazer. Enfim, gratidão sempre!”, finaliza.
Em resumo, o Implante Coclear não apenas ajuda na capacidade auditiva, mas também proporciona uma nova perspectiva de vida, conectando indivíduos ao mundo sonoro que os rodeia.
Seu impacto é verdadeiramente revolucionário, oferecendo esperança e oportunidades para aqueles que vivem com deficiência auditiva.