De 3 de abril a 9 de junho de 2024, o Centro Cultural FIESP estará em destaque com a exposição Maracatu Rural — A Magia dos Canaviais.
Esta mostra traz para São Paulo a riqueza artística dos trabalhadores da Zona da Mata de Pernambuco, destacando o Maracatu Rural ou Maracatu de Baque Solto, uma importante manifestação reconhecida como Patrimônio Cultural Brasileiro.
A exposição é ambientada em uma cenografia que evoca o território da Zona Canavieira Pernambucana e oferece uma ampla gama de elementos para os visitantes apreciarem.
Desde documentos e vídeos até fotografias, objetos, textos, indumentárias e peças de artesanato, além de apresentações audiovisuais, os visitantes terão a oportunidade de mergulhar na fascinante cultura do Maracatu Rural.
Quer saber mais desta exposição?
Confira abaixo a entrevista exclusiva com o curador da exposição Afonso Oliveira.
Victor Hugo Cavalcante: Primeiro, é um prazer poder recebê-lo no Folk, e gostaria de começar perguntando: Como surgiu a ideia de realizar uma exposição sobre o Maracatu Rural e qual é o objetivo principal por trás dessa iniciativa?
Afonso Oliveira: Olá, Victor, o prazer também é meu.
Tenho uma trajetória de mais de 20 anos com os Maracatus Rurais.
Já produzi, discos, pesquisas, livros, filme, sempre trabalhando com eles.
E faltava uma exposição onde pudéssemos mostrar esta rica história.
É um projeto de vida conseguir que o Maracatu Rural ocupe os espaços contemporâneos das artes.
Victor Hugo Cavalcante: Como você vê o papel da exposição Maracatu Rural — A Magia dos Canaviais na preservação e divulgação da cultura do Maracatu Rural, especialmente para as gerações mais jovens?
Os jovens da Zona da Mata pernambucana estão descobrindo e se envolvendo nos maracatus, resultado de um trabalho realizado na região, denominado Movimento Canavial.
A exposição faz parte desta estratégia do Movimento Canavial.
Victor Hugo Cavalcante: Quais foram as principais inspirações por trás do projeto expográfico da exposição e como ele contribui para enriquecer a experiência do visitante?
Júlia Filizola é uma designer de grande criatividade e já trabalha comigo há alguns anos. Solicitei a ela que criasse um ambiente que remetesse ao território.
Ela se inspirou no barro, na argila, onde se planta a cana.
O visitante terá uma experiência imersiva e perceber que o Maracatu rural é uma manifestação criada por trabalhadores.
Victor Hugo Cavalcante: Além dos artistas contemporâneos como Chico Science e Gilberto Gil, que tipo de influência o Maracatu Rural exerce sobre a cultura brasileira?
A ascensão do Maracatu Rural na década de 1990, com o crescimento do número de grupos e uma produção artística relevante, inspirou principalmente quem trabalha com a cultura popular brasileira.
A apresentação do Maracatu Estrela de Ouro no prédio da Bienal, em 2004, a trilogia Maracatu Atômico Kaosnavial, com Jorge Mautner, e o Festival Canavial são momentos importantes e históricos.
A partir daí percebe-se, com a experiência do samba no Rio de Janeiro, que a sociedade queria a cultura popular além do folclore.
Acho que a partir daí os mestres e grupos passam a ter um papel protagonista na arte brasileira.
O entendimento sobre cultura popular hoje é muito mais amplo, os jovens da periferia sabem que o que eles produzem é cultura popular.
Victor Hugo Cavalcante: Como a exposição aborda a relação entre o Maracatu Rural e temas como religião e trabalho, e por que esses aspectos são importantes para entender a essência dessa manifestação cultural?
A sociedade ainda conhece muito pouco as religiões de matriz indígenas.
O Maracatu Rural é muito ligado à Jurema Sagrada e muita gente acha que eles cultuam os orixás, mas quem cultua os orixás são os Maracatus Nação.
Mostraremos a Jurema e os instrumentos de trabalho para aproximar a sociedade destes conhecimentos.
Apresentar a cultura é sempre contribuir com a educação. Infelizmente, nossas escolas ainda apresentam pouco da cultura brasileira para as crianças e jovens.
Victor Hugo Cavalcante: Como foi o processo de curadoria da exposição Maracatu Rural — A Magia dos Canaviais e quais foram os critérios utilizados na seleção dos itens expostos?
Foi um processo prazeroso e cansativo.
Para juntar este acervo e trazê-lo para a galeria do Centro Cultural FIESP foi necessário muito cuidado e respeito com os fazedores da cultura.
Além do acervo, mostraremos um filme produzido em grande parte no carnaval deste ano.
Foi necessária também a restauração de alguns objetos.
São mais de 80 fotografias, incluindo algumas fotos de 1964 e fotos de trabalhadores nos antigos engenhos.
Victor Hugo Cavalcante: Além da exposição em si, quais são as atividades complementares que o público pode esperar ao visitar o Centro Cultural FIESP durante o período da mostra?
Realizarei com o mestre de caboclo de lança Luiz Caboclo cinco visitas guiadas nos dias 03, 04 e 05 de abril.
Victor Hugo Cavalcante: Poderia destacar alguns dos elementos mais emblemáticos presentes na exposição e explicar sua relevância no contexto do Maracatu Rural?
A gola de vidrilhos; bordada pelo mestre Nenê Modesto; as fotografias da pesquisadora norte-americana Katarina Real, de 1964 e 1965, do acervo da Fundação Joaquim Nabuco; o conjunto de cortejo feito de barro.
São muitos elementos, cada um com sua importância e todos carregam uma história impressa de muito trabalho pela cultura brasileira.
Victor Hugo Cavalcante: Considerando sua vasta experiência junto aos maracatus rurais, quais são as principais lições ou reflexões que você espera que o público leve consigo após visitar a exposição?
Não sei se será possível, mas eu gostaria de ver o Brasil lutando contra o racismo estrutural, que faz com que a arte e o trabalho do povo brasileiro não sejam valorizados.
O Sesi presta uma grande contribuição ao ‘desesconder’ o Maracatu Rural e colocá-lo aonde ele merece.
Esse para mim é o grande projeto de nação: eliminar o racismo é fundamental para que nos tornemos uma grande nação.