Teatro e educação são o combustível que movem o Buzum! Brasil afora.
O projeto nasceu em 2010 da vontade conjunta de Beto Andreetta, Jackson Íris e Mari Gutierrez que uniram a paixão e a experiência para levar teatro de bonecos para escolas, crianças e adolescentes que ainda não conhecessem ou tivessem dificuldade de acesso a esse mundo lúdico.
O BuZum! segue a mesma trilha dos saltimbancos da idade média, que iam com seus pequenos teatrinhos de cidade em cidade, alegrando adultos e crianças, inventando mundos onde tudo é possível, repete caminhos feitos por Garcia Lorca, um andarilho da arte e bonequeiro, que percorria a Espanha com apresentações populares e segue estradas já percorridas pelos mamulengueiros, os bonequeiros populares do Nordeste, que encantam plateias do interior do país desde os tempos coloniais.
Esse espaço de sonhos carrega consigo todo o equipamento teatral necessário para os espetáculos: tem plateia, tem palco, iluminação, sonorização, ar condicionado… (sim senhor!).
É um ônibus especialmente reformado que chega à porta das escolas, creches, casas, praças, parques…
Um teatro que vai ao encontro do seu público, com clima intimista e bonecos que encenam diferentes histórias e situações.
E hoje eles nos deram uma carona virtual para conhecer mais sobre os trabalhos deles neste bate-papo com a diretora Mariane Milan Gutierrez.
Victor Hugo Cavalcante: Primeiro é um prazer poder recebê-los em nosso site, e gostaria de começar perguntando: Como começou a relação dos integrantes da Cia. Buzum! com as artes cênicas?
Cia Buzum!/Mariane Milan Gutierrez: Oi, Victor, muito obrigada pelo espaço, é sempre um prazer poder falar do BuZum!!
Respondendo a sua pergunta, as pessoas que fazem parte do BuZum! são ligadas ao universo do teatro de boneco, seja por trabalhos anteriores ou por conhecer esse universo com a própria Cia.
Eu, por exemplo, fiz faculdade de teatro no Rio de Janeiro e lá já comecei a trabalhar com teatro de bonecos.
Ao vir para São Paulo, entrei para a Cia Pia Fraus e segui minha carreira investigando essa linguagem.
Três anos após chegar a São Paulo, fundei a Cia BuZum! com o Beto Andreetta (um dos fundadores da Cia Pia Fraus) e com o Jackson Íris, que também faz parte da Cia Pia Fraus.
Victor Hugo Cavalcante: Depois de 12 anos de atividades, a trupe segue, em 2023, mais uma programação cheia de diversão, alegria e ludicidade com 128 apresentações em 50 municípios, de oito estados do país (São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro), para vocês o quanto o ônibus-teatro possibilita levar adiante não somente a arte cênica, mas cultura em geral, para cidades como o interior ou para locais mais carentes que muitas vezes não têm como assistir a espetáculos como esses?
Poder levar o teatro ao encontro do público, principalmente a locais onde não há acesso aos bens culturais ou onde há pouco acesso, é um privilégio e um prazer enorme, para nós essa é uma função importantíssima do teatro na sociedade, poder proporcionar uma experiência cênica a quem não tem acesso a ela e melhor ainda, gratuitamente.
A grande maioria das crianças que entram no BuZum! para assistir aos espetáculos nunca viu uma peça teatral, ser o primeiro contato dessas crianças com o teatro é o que nos move a seguir adiante.
Victor Hugo Cavalcante: Como surgiu a ideia do ônibus-teatro da Cia Buzum!?
A ideia inicial foi do Beto, ele viu algo parecido em uma cidade fora do Brasil e se encantou.
Pensou, então, em transformar um ônibus rodoviário em sala de espetáculo, porque se a gente tirar as cadeiras, temos uma “caixa preta” de 13m de comprimento por 2,4 m de largura, um espaço mais que suficiente para montar uma intimista sala de teatro.
E o melhor, com rodas, ela pode ir a cidades onde não há teatro, chegar a escolas em zonas rurais, enfim, onde um ônibus conseguir chegar, o teatro estará lá.
Victor Hugo Cavalcante: Como já dito em matéria no nosso site, o BuZum! nasceu para promover a experiência do teatro para crianças, contribuindo, simultaneamente, com a construção do conhecimento e do aprendizado de forma lúdica, para vocês qual a importância de se fazer essa união entre a arte (no geral) e o aprendizado lúdico?
O teatro pode ser um importante meio para auxiliar a aprendizagem, as peças têm uma relação com o currículo escolar, falamos de temas levantados em sala de aula, mas acima de tudo são peças lúdicas, a criança aprende e se conecta a um assunto importante de maneira leve e divertida, a parte didática acaba sendo uma consequência daquela experiência única que ela viveu.
Temos alguns retornos de professores nos falando que as aulas ficaram muito mais interessantes para as crianças quando eles utilizam o nosso livro e propõem algumas atividades que têm no material ou quando simplesmente citam alguma cena da peça que a turma assistiu.
Victor Hugo Cavalcante: As crianças que assistem aos espetáculos ainda ganham um teatro de papel para brincarem e criarem as próprias histórias com seus bonecos e cenários, como surgiu essa ideia?
A gente queria que a experiência do BuZum! continuasse, mesmo depois que o ônibus-teatro fosse embora da escola.
Inspirados no Teatro de Brinquedo, brinquedo popular na Europa no século passado, em que pedaços de papel eram usados para criar diferentes teatros e personagens, criamos o nosso Teatro de Papel, para que as crianças possam, a partir do material que recebem, brincar de fazer teatro e criar suas próprias histórias.
O Teatro de Papel do BuZum! é o maior sucesso, as crianças amam e a gente sempre recebe alguns vídeos delas brincando em casa, contando a histórias para outros membros da família.
Victor Hugo Cavalcante: Quais foram os trabalhos mais incríveis e os mais complicados que vocês já apresentaram? Por quê?
Os espetáculos do BuZum! fazem muito sucesso com as crianças, todos eles têm uma aceitação incrível, a gente utiliza muitas técnicas diferentes de manipulação em cada peça, e isso atrai o público.
Mas certamente o espetáculo Intolerância foi o mais complicado, foi a primeira peça que fizemos voltada para o público adolescente, e o tema central é bullying, um assunto delicado que deve ser falado sempre.
Foi um grande desafio fazer uma peça de 20 minutos para falar de um assunto tão complexo e como a gente não queria personificar a pessoa que sofre bullying na escola, optamos por contar essa história por meio da camiseta, da mochila e do caderno de uma menina que sofria essas agressões repetidas vezes no ambiente escolar.
O texto foi reescrito algumas vezes até a gente chegar ao ponto em que queríamos e foi um enorme sucesso, ganhamos até prêmio com esse texto.
Outro desafio dessa peça foi apresentar para as crianças, apesar do espetáculo ser voltado para os adolescentes.
Não tem nada nele que seja proibido para crianças menores, mas ficamos um pouco inseguros se elas iriam embarcar na história e captar a mensagem e para nossa surpresa, a peça funcionou muito bem, tanto que uma mãe veio nos dizer certa vez que seu filho de quatro anos disse a ela que não iria mais morder os amigos na escola.
Fiquei impressionada, porque não falamos na peça sobre mordidas, por exemplo, mas foi isso que ele entendeu.
Victor Hugo Cavalcante: Vocês realizarão a exibição do espetáculo Perigo Invisível, vocês já o tinham apresentado antes? Qual tem sido o feedback do público para esse trabalho?
Esse espetáculo estreou no ano passado, fizemos algumas apresentações pelo Brasil, a peça faz um enorme sucesso.
Ela é bem musical e as crianças adoram as músicas e os personagens, que apesar de serem os vilões, têm lá sua graça, mas ainda que se identifiquem com a Dona Bactéria, com o Virulão (um vírus) e com o Fungoso (um fungo), elas vão ao delírio quando eles são exterminados pelos bons hábitos de higiene.
Victor Hugo Cavalcante: O espetáculo Perigo Invisível conta a história de Fungoso, Dona Bactéria e Virulão que querem infectar o maior número de crianças possível e aproveitam dos maus hábitos de higiene de algumas delas para colocar seu maquiavélico plano em prática, para vocês qual é a importância das crianças assistirem histórias sobre boa higiene, ainda mais numa época que a Covid-19 (e suas mutações) ainda impera?
Esse assunto é muito atual, antes mesmo de criar esse espetáculo eu recebi muitos pedidos de professores para que levássemos uma peça com esse assunto às escolas, afinal, existe mesmo essa fase da infância quando a criança não quer tomar banho ou escovar os dentes.
A peça mostra a importância disso e ao final elas correm para lavar as mãos, é muito legal de ver.
Sem contar que falamos da importância das vacinas para a erradicação de algumas doenças, a gente dá o recado!
Victor Hugo Cavalcante: Quais artistas e cias mais influenciam e no que eles influenciam cada integrante do grupo?
A própria Cia Pia Fraus é uma grande influência para nós, uma Cia que há 38 anos investiga o universo do teatro de bonecos e viaja o Brasil e o mundo levando seus espetáculos.
A gente bebe muito dessa fonte, apesar de trabalharmos com bonecos em dimensões menores e histórias mais curtas.
Eu sou muito fã do Sobrevento, uma Cia paulista com um trabalho lindíssimo, tanto nos seus espetáculos infantis quanto adultos.
Gosto muito também da Cia Pequod, do Rio de Janeiro, que tive o prazer de fazer parte durante cinco anos, eles têm uma maestria na manipulação dos bonecos, é lindo de ver.
Victor Hugo Cavalcante: Conte-nos o que podemos esperar para os próximos trabalhos, além do que já foi comentado nas perguntas acima.
Em 2023 estamos com uma programação semanal dos espetáculos da BuZum! no Galpão dos Bonecos, na Zona Oeste de São Paulo, onde a cada mês apresentamos um espetáculo diferente da BuZum!, em março levamos ao palco O Grande Perigo e agora em abril, será a vez do espetáculo Curumim Mani – A Origem da Mandioca.
Estar em temporada permanente era um sonho nosso, para que o paulistano pudesse ter acesso aos espetáculos dessa cia que nasceu aqui na cidade, mas que viaja o Brasil todo.
Ainda em 2023 temos previstas duas estreias, Aquela Casa, o primeiro espetáculo da Cia que vai abordar o clima de suspense para crianças, conta a história de uma senhora que aparentemente leva muito lixo para dentro da casa dela, mas depois a gente descobre que, na verdade, ela construiu uma casa totalmente sustentável com resíduos encontrados na rua.
A outra estreia será do espetáculo Ovelha Colorida, baseada no livro homônimo da Carolina Portella, que inclusive é uma das atrizes da Cia, a peça conta a história de Colorida, uma ovelha que nasce diferente das demais e sai em uma viagem ao mundo para conhecer outras coisas fora da fazenda onde vive, a peça fala da importância de nos aceitarmos e aceitarmos as diferenças de todos.