Na aridez do sertão baiano, com armas em punho sob o sol escaldante, tropas avançam prontas para dizimar civis e enfrentar jagunços que têm como trunfo o conhecimento geográfico, e a capacidade de sobreviver em situação miserável.
A fome, a desidratação, as feridas abertas, as privações de sono e descanso rondam ambos os lados, assim como os urubus se aglomeram ansiosos pelas sobras dos embates.
Por esse cenário inóspito, Roosevelt Colini, que assina como R. Colini, convida o leitor a uma jornada de sobrevivência no livro Entre as Chamas, Sob a Água.
O romance histórico retrata a brutalidade da Guerra de Canudos, em uma terra banhada em sangue e desesperança, onde a dignidade é arrancada e a humanidade se esvai.
No meio desse massacre, que eviscerou ambos os lados, o protagonista, um jovem combatente do exército brasileiro, perde a empatia, a fé e o propósito.
Acostumado às estratégias militares que forjaram os heróis nos campos de batalha, ele logo percebe o despreparo e a incompetência do exército para aquele cenário.
O livro mostra que, sem instrução acerca do comportamento dos jagunços na guerra, o pelotão é surpreendido por um “inimigo invisível”.
Para sobreviver, o soldado atravessa a trincheira e passa a combater os próprios colegas, enquanto sucumbe à solidão e ao odor podre da guerra.
“Afinal de contas, ainda que Canudos acabe sem que eu morra, mesmo se eu não tivesse vivido entre os dois lados da guerra, sinto que minha vontade de fuga não é vontade de regresso, porque não gostaria de ver mais ninguém, não gostaria de encontrar meu pai, que saberia, no momento em que chegasse, que eu estaria destituído de ilusões e que o filho que partiu não é o mesmo que retorna. Não é vergonha, não é culpa, não é arrependimento;
Entre as Chamas, Sob a Água, p. 52
é ausência de vontade de estar entre humanos, é a alma que se foi, farta do que viu.”
O personagem principal de Entre as Chamas, Sob a Água descreve na calada da noite os horrores que vivencia, com um pequeno lápis em papel.
Para não ser descoberto, relata o drama no Arraial em francês, língua incomum aos envolvidos no conflito.
Presenciar a barbárie das degolas, as condições insalubres nos acampamentos, as dores causadas pela fome, sentir o cheiro ocre do sangue misturado a fezes, urina e suor, arrancam a civilidade do protagonista, tornando-o cada vez mais solitário e silencioso.
Nesta nova realidade, ele recebe a alcunha de Chico Mudinho e passa a conviver com personagens históricos, como Antônio Conselheiro e João Abade.
Colini, autor do romance Curva do Rio, obra elogiada pela crítica e pelo público, prova que ainda existe um universo humano a ser explorado, interpretado e atualizado em relação a essa batalha histórica.
O escritor oferece uma vigorosa composição literária para marcar uma parte da história brasileira que não deve ser esquecida.
A saga do jovem oficial do exército não nos deixa esquecer de homens, mulheres e crianças que tiveram a existência apagada pairando entre o fogo e as águas que afundaram Canudos.
Entre os elogios dos leitores ao livro destacamos dois escritos por perfis literários no Instagram.
“Conhecer a história do nosso país, do nosso povo é algo transformador, que todos deveriam fazer, e nesse livro o autor conseguiu trazer os acontecimentos desse momento tão triste de uma maneira delicada e verdadeira.” Conta Bel Líbera, responsável pelo perfil Lendo Entre Costuras.
Já a influenciadora do Meu Capítulo Favorito escreveu que “ler uma ficção sobre uma guerra que aconteceu no Brasil, e ainda mais, no Nordeste, onde eu moro, foi surreal! É difícil acreditar o absurdo que foi a proporção dessa fatalidade. Ver como o autor descreveu fielmente o cenário, perceber os detalhes pesquisados para o livro, traz ainda muita sensibilidade e emoções indescritíveis. Entre as chamas, sob a água revisita toda a profundeza dessa crueldade. Indico demais! Leitura necessária e didática”.