A história de Valentin Ramos começa como tantas outras que raramente chegam ao noticiário: o marido e sua esposa em casa após uma comemoração, uma invasão violenta e um sistema penal incapaz de responder com a mesma velocidade da tragédia.
O ex-militar e repórter acostumado a acompanhar crimes alheios, e sua cônjuge Maria Eduarda — pediatra celebrando a primeira gestação, tiveram a vida interrompida em poucos minutos.
Valentin sobreviveu após um traumatismo craniano severo; ela e o bebê não resistiram.
O choque inicial, porém, é somente uma porta de entrada para questões maiores, como o desejo de vingança.
Sem Remorso, thriller policial escrito pelo médico neurocirurgião Luciano Manzato, provoca debates sobre o que acontece quando o sistema judicial não responde e questiona: de qual forma agir diante da impunidade?
Não existem respostas fáceis, mas há o retrato de como o trauma pode se transformar em reação extrema quando instituições falham, algo dolorosamente familiar em um país marcado pelo descaso com a população.
“A raiva e a frustração fervem dentro dele, confrontando-o com a dura realidade de um sistema falho que permite que criminosos perigosos continuem agindo impunemente.”
(Sem Remorso, p. 33)
A investigação do caso reforça essa tensão.
Promessas iniciais logo deram lugar a lacunas, fragilidades e decisões que contrariavam o senso comum.
O principal suspeito tinha histórico extenso, ligação com uma gangue conhecida e, ainda assim, saiu da audiência de custódia em liberdade.
Para a família, era como se o sistema operasse em outra frequência, distante do impacto real da violência.
Nesse cenário, Carla, irmã e advogada do protagonista, encontrou padrões inquietantes: liberações frequentes de integrantes do mesmo grupo criminoso, decisões que se repetiam com nomes diferentes e uma engrenagem de favorecimentos rara de aparecer nas manchetes.
Enquanto isso, em meio à falta de respostas sobre a morte da esposa, Valentin enfrentava as sequelas do trauma — uma lesão no lobo frontal alterou seu comportamento e intensificou impulsos (entre apatia e raiva), que o levaram a fazer justiça com as próprias mãos.
Luciano Manzato, médico neurocirurgião e leitor voraz de narrativas de ação e justiça, empresta ao livro um olhar clínico sobre o corpo humano e seus limites.
Esse repertório dá consistência à transformação de Valentin, cuja lesão craniana se torna chave para entender a escalada de escolhas que ele passa a fazer.
Sem Remorso revela não somente a corrosão da própria humanidade, mas também a falência de um sistema que, ao patinar na resposta, leva vítimas a acreditar que a vingança é a única justiça possível.
Embora ficcional, a obra funciona como um alerta sobre os efeitos sociais da impunidade e da corrosão institucional no país.
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