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Mario Rodrigues Louzã Neto desvenda esquizofrenia em guia

Entrevista com o psiquiatra discute os desafios do transtorno, como superá-los e como promover uma reintegração positiva na sociedade.

Foto do médico psiquiatra e entrevistado do dia Mario Rodrigues Louzã Neto.

A esquizofrenia é um transtorno mental geralmente grave, de grande relevância em termos de saúde pública.

Ela atinge o adolescente ou o adulto jovem no momento em que está se preparando para começar a vida de forma independente.

Estatísticas mostram que cerca de 0,8% das pessoas é afetada pela doença, independentemente de sexo, cor, raça e condição socioeconômica.

Isso significa algo em torno de 1,7 milhão de pessoas com esquizofrenia no Brasil.

Trata-se de uma doença em geral crônica, de longa duração, que o indivíduo poderá ter por toda a vida, e que muitas vezes traz limitações nem sempre muito bem compreendidas.

Esse transtorno mental é ainda hoje uma palavra carregada de preconceitos e estigmas.

O primeiro passo para vencer esses preconceitos é a informação.

Eis o objetivo do médico psiquiatra Mario Rodrigues Louzã Neto ao escrever o livro Como lidar com a esquizofrenia: trazer informações científicas sobre a doença mental denominada esquizofrenia.

Destinado a pacientes, familiares e profissionais da saúde, este guia pretende enfatizar que a esquizofrenia, embora possa tornar a pessoa dependente de acompanhamento e cuidado para poder levar uma vida normal, é uma doença como outra qualquer.

Esse entendimento é fundamental para o próprio portador e para todos os envolvidos mais diretamente com ele.

O escritor e médico psiquiatra Mario Rodrigues Louzã Neto é formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), com residência médica em Psiquiatria no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

Também é pós-doutorado pelo Instituto Central de Saúde Mental em Mannheim, na Alemanha, doutor pela Universidade de Wurzburg, na Alemanha, especialista em Psiquiatria Geral pela Associação Brasileira de Psiquiatria e bacharel em Filosofia pela USP.

Mario ainda é médico assistente e coordenador do Programa de Esquizofrenia (Projesq) e do Programa de Déficit de Atenção e Hiperatividade (PRODATH) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

E nesta entrevista exclusiva Mário R. Louzã Neto nos explica mais sobre a esquizofrenia e sobre o guia prático que ele escreveu.

Victor Hugo Cavalcante: No livro Como lidar com a esquizofrenia, o senhor discute a importância de vencer os preconceitos e estigmas associados à esquizofrenia. Quais são as principais barreiras que ainda existem e como podemos superá-las?

Mario Rodrigues Louzã Neto: Apesar de estarmos no século XXI, ainda há muito preconceito em relação aos transtornos mentais, especialmente a esquizofrenia.

A melhor forma de vencer preconceitos e barreiras é falar sobre a doença e dar informações claras sobre como devem ser feitos o diagnóstico e o tratamento.

No caso da esquizofrenia, as pessoas têm muita dificuldade de entender que muitos dos sintomas que o paciente apresenta não são simplesmente porque a pessoa não consegue fazer alguma coisa ou não consegue lidar com alguma situação especial.

Nesse sentido, a imprensa tem um papel muito importante por atingir um público bastante amplo.

Victor Hugo Cavalcante: Poderia explicar a diferença entre os termos doença, distúrbio, desordem e transtorno, e por que é importante compreender essas distinções ao falar sobre esquizofrenia?

Em medicina, o termo doença é utilizado o tempo todo, de uma forma simples, tal como todo mundo a entende.

Usamos o termo doença, pois a imensa maioria das doenças tem uma base conhecida, uma causa conhecida.

Já na psiquiatria, o termo que foi adotado, em inglês, é disorder.

E esse termo não tem uma boa tradução para o português.

Adotou-se, então, na tradução para o português, o termo transtorno, como uma forma de caracterizar o equivalente à doença.

Quando falamos de doenças que não sabemos as causas, adota-se o termo transtorno.

Victor Hugo Cavalcante: A esquizofrenia é descrita como uma doença crônica e de longa duração. Como os pacientes e seus familiares podem se preparar para lidar com os desafios diários que essa condição impõe?

Da mesma forma que acontece com outras doenças médicas, por exemplo, a pressão alta ou diabetes.

A esquizofrenia é de longa duração, de tal modo que a pessoa terá que se cuidar ao longo da sua vida inteira.

Da mesma forma que as pessoas cuidam do seu diabetes ou da sua pressão alta.

A família pode ajudar orientando o paciente em relação à tomada de medicação.

E incentivar o paciente a participar das atividades de reabilitação e de reintegração familiar e social.

Victor Hugo Cavalcante: Quais são as principais causas da esquizofrenia abordadas no livro, e como essa compreensão pode auxiliar no tratamento e no apoio aos pacientes?

No meu livro, eu procuro explicar de forma bastante simplificada o que se sabe atualmente sobre os mecanismos da esquizofrenia.

Sabemos que o fator genético tem uma relevância.

Embora ele não explique tudo.

Sabemos também que alterações no sistema nervoso central, no cérebro, são responsáveis pela desorganização química que acontece nos sistemas de neurotransmissão, principalmente envolvendo um neurotransmissor chamado dopamina.

Essa desregulação do neurotransmissor dopamina e de outros neurotransmissores é responsável pelos sintomas.

Victor Hugo Cavalcante: O senhor menciona a busca pela reintegração dos pacientes como um objetivo do tratamento. Quais são as estratégias e abordagens mais eficazes para alcançar essa reintegração?

O tratamento medicamentoso melhora os sintomas.

Porém, por si só, não consegue promover a reabilitação e a reintegração dos pacientes.

Por isso, é necessário o uso de várias estratégias, chamadas de psicossociais, para promover a reintegração do paciente.

Existem várias estratégias, cada uma com uma função específica.

A terapia ocupacional serve como um treinamento para preparar o indivíduo para suas atividades do dia a dia.

Já a terapia cognitivo comportamental tem a função de melhorar alguns sintomas, principalmente aqueles que não responderam bem aos tratamentos medicamentosos.

Existem outras estratégias que visam a trazer de volta o paciente para atividades que, em última análise, servirão para que ele possa buscar um emprego em algum momento da sua reintegração psicossocial.

Victor Hugo Cavalcante: Como os familiares podem desempenhar um papel positivo no suporte e tratamento de um familiar com esquizofrenia? Existem dicas específicas que o senhor poderia compartilhar?

Os familiares são uma peça fundamental no tratamento da esquizofrenia.

Eles podem colaborar no sentido de ajudar o paciente a se organizar em relação a tomar as medicações.

E eles podem também ajudar no que diz respeito à reintegração psicossocial.

Para isso, é muito importante que os familiares também entendam como a esquizofrenia acontece e possam também vencer os seus próprios preconceitos.

Victor Hugo Cavalcante: O livro dedica um capítulo às outras comorbidades. Quais são as condições mais comuns que coexistem com a esquizofrenia e como elas podem impactar o tratamento?

As comorbidades podem ocorrer em diversas fases da doença, sendo preciso tratá-las juntamente com a esquizofrenia propriamente dita.

Muitas vezes nós temos que intervir com outros tratamentos, além dos tratamentos medicamentosos específicos para esquizofrenia, os quais são os antipsicóticos.

Então, por exemplo, se ao longo da doença o paciente tem um quadro depressivo, é preciso que ele receba a medicação específica, no caso, os antidepressivos, para melhorar essa comorbidade.

Victor Hugo Cavalcante: A arte é mencionada como uma área de interesse no contexto da esquizofrenia. De que maneiras a arte pode ser benéfica para os pacientes e como ela é integrada no tratamento?

No meu livro, eu apresento alguns casos de pessoas relativamente famosas ou conhecidas que têm ou tiveram esquizofrenia.

Esses casos possibilitam mostrar como essa doença pode acontecer com qualquer um e como foi a vida dessas pessoas apesar da doença.

A ideia é que elas possam ajudar os pacientes a compreenderem que não são os únicos a ter o problema e que a doença pode ser tratada.

Victor Hugo Cavalcante: Como o senhor abordou as perguntas mais frequentes que os pacientes e seus familiares têm sobre esquizofrenia no livro?

Quando o paciente, em geral, um adolescente ou adulto jovem, adoece pela primeira vez, isso é um grande choque para a família.

No início, as pessoas se revoltam ou negam que o paciente está doente.

Muitas vezes buscam informações na internet, por exemplo, e ficam perdidas.

O objetivo do meu livro é justamente que elas possam acessar informações baseadas na ciência, baseadas no que sabemos da doença.

Eu busquei juntar as perguntas que muitos dos meus pacientes e familiares trazem, as suas dúvidas, os seus questionamentos, suas angústias, e traduzir isso para um livro que pudesse ser consultado em qualquer situação, que os familiares se vejam com alguma dúvida ou alguma questão.

Procurei evitar termos muito técnicos, apenas aqueles essenciais, para o leitor poder entender a doença e, com isso, vencer seu preconceito.

Só assim, isenta de preconceito, a pessoa pode ajudar o outro que necessita dela.

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