Em 3 de maio de 2025, Lady Gaga realizou um show gratuito na Praia de Copacabana, Rio de Janeiro, reunindo, segundo a Riotur, cerca de 2,1 milhões de pessoas, tornando-se o maior da carreira da artista e o maior já feito por uma mulher na história.
O evento, parte da turnê Mayhem Ball, marcou seu retorno ao Brasil após 13 anos e teve grande impacto cultural e turístico.
A apresentação também reacendeu debates sobre inclusão e acessibilidade em eventos de grande porte.
Apesar do discurso da artista em defesa da diversidade e das pessoas com deficiência, muitos relatos nas redes sociais denunciaram falhas graves na organização do evento, especialmente aos espaços destinados para PcDs, com relatos de invasão, estrutura cedida e dificuldades de acesso.
Nesta entrevista, a psicóloga clínica Andreia Convento, especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), Análise Aplicada do Comportamento (ABA) saúde mental, atenção psicossocial, e neuropsicologia, reflete sobre o impacto simbólico de figuras como Lady Gaga na autoestima e no sentimento de pertencimento de pessoas com deficiência.
Ela também aponta como a inclusão efetiva depende de ações práticas e estruturais, e não apenas de representatividade.
Victor Hugo Cavalcante: Qual é o impacto psicológico positivo que artistas como Lady Gaga podem ter sobre pessoas com deficiência, especialmente aquelas que lidam com doenças invisíveis ou condições crônicas?
Andreia Convento: A representatividade que a artista possui influencia e traz uma sensação de validação sobre o que o indivíduo tem ou sente.
Lady Gaga fala abertamente sobre suas demandas tanto a dor crônica como as invisíveis, isso ajuda a validar as experiências de outras pessoas com doenças similares, a diminuir o estigma e torno de condições que não são visíveis; assim como fazer com que essas pessoas se sintam vistas, compreendidas, propiciando uma identificação com alguém que tem uma forte representatividade como a cantora.
Ao falar sobre sua condição, inspira e traz um comportamento de resiliência, demonstrando ser possível alcançar o sucesso e reconhecimento mesmo enfrentando desafios crônicos como o caso dela, que sofre de fibromialgia.
Lady Gaga demonstra publicamente sua vulnerabilidade sem perder sua credibilidade e luta por sua saúde mental e física, inspirando assim muitas pessoas com deficiência a acreditarem e manterem sua autoestima.
A postura da artista é inclusiva em defesa de grupos marginalizados como a comunidade LGBTQIA+ e pessoas com deficiência, promovendo dessa forma uma sensação de pertencimento para aqueles que se sentem à margem da sociedade, promovendo o cuidado com a saúde mental e física.
Lady Gaga estimula e encoraja diversas pessoas, usando a arte e sua criatividade como maneiras de enfrentar suas dores, principalmente para aqueles que lutam com a invisibilidade, dor e exclusão.
Victor Hugo Cavalcante: Como a representatividade de Lady Gaga ajuda a combater o estigma e o isolamento social entre as pessoas com deficiência?
Por Lady Gaga ser uma figura pública e falar abertamente sobre suas próprias experiências, sua dor crônica e questões de saúde mental, ao compartilhar essas vivências, da visibilidade, causa impacto, ajudando a desmistificar os preconceitos sobre o estigma de o que significa viver com uma deficiência.
A postura artística diante de como lida com sua dor, transformando-a em arte e ativismo, mostra que pessoas com deficiência não podem ser definidas por ela, colaborando positivamente para ressignificar o olhar das pessoas sobre a deficiência e ajudando a fortalecer os indivíduos que a enfrentam.
Por meio de sua arte, projetos e fundações, Gaga promove a inclusão, saúde mental e a autoestima das pessoas, colaborando de maneira fundamental na luta contra o isolamento social.
Por ser uma artista com alcance global, sua influência impacta com grande força positiva sobre a opinião pública, ajudando a diminuir o estigma sobre a deficiência e a dor externa.
Ela se consolidou como um exemplo de inspiração, modelo de superação e resiliência, pois ver alguém que lida com desafios, sofrimentos reais ser bem-sucedida traz esperança às pessoas com deficiência e que se sentem descriminadas.
Não estou falando de romantizar o sofrimento e a dor, mas sim de mostrar que existe mais além da deficiência, que com atitudes como essas propiciamos uma maior inclusão e pertencimento às pessoas que possuem alguma deficiência e não acreditam que isso é possível.
Victor Hugo Cavalcante: Em sua experiência clínica, como as atitudes de inclusão ou exclusão em eventos culturais afetam a saúde mental das PcDs?
A inclusão fortalece a autoestima e identidade social do indivíduo, participar ativamente de eventos culturais, reforça o sentimento de pertencimento e reconhecimento social, sendo de extrema importância para a saúde mental.
O acesso à arte e à cultura cria vínculos sociais, contribuindo significativamente com a depressão, ansiedade, reduzindo complexos e baixo autoestima.
A inclusão propicia sentimentos de valorização e ambientes que oferecem acessibilidade demonstram que se importa e que todos possuem direito a desfrutar daquele ambiente, contribuindo assim positivamente com o bem-estar psicológico.
Já a exclusão reforça a baixa autoestima, desperta sentimento de rejeição e a falta de acessibilidade reforça a ideia de que PcDs não pertencem à sociedade, aumentando o risco de depressão, ansiedade, etc., trazendo cada vez mais a sensação de inadequação.
A exclusão também causa a desesperança e isolamento social, trazendo um sofrimento psíquico e impactando na saúde mental e emocional.
A exclusão atua como um alto fator de risco para o adoecimento psicológico, trazendo ao indivíduo um sofrimento maior e falta de esperança em uma qualidade de vida melhor, acreditando e buscando por realizações tanto na vida pessoal como profissional.
Sendo assim, a inclusão social atua diretamente no cuidado com a saúde mental, emocional, aumentando o sentimento de pertencimento e empatia, reduzindo assim o sofrimento psíquico.
Victor Hugo Cavalcante: Quais seriam as principais estratégias de inclusão que você sugeriria para eventos de grande porte para garantir um ambiente saudável e acolhedor para pessoas com deficiência?
Os eventos de grande porte precisam garantir um ambiente inclusivo e para isso é preciso planejamento e investimentos.
A acessibilidade deve ser física e estrutural com:
- Rampas, elevadores e corrimãos, banheiros adaptados por todo o local (a sinalização deve ser visual e tátil e as rotas entre os palcos devem ser acessíveis para as áreas de alimentação e banheiros).
- Intérpretes de Libras, legendas em tempo real e audiodescrição ao vivo para as pessoas com deficiência visual.
- Espaços para autistas e neurodivergentes com menor estímulo sonoro e luminoso.
Além disso, os eventos deveriam contar com pessoas preparadas para dar suporte, espaços de acolhimento e prioridade no acesso às filas.
Os eventos precisam começar a se preparar e fazer os movimentos necessários para se engajar de maneira efetiva e positiva na inclusão, pois todos possuem o direito de fazerem parte do convívio social em eventos, gerando assim o pertencimento às pessoas com deficiência.
Victor Hugo Cavalcante: O que o ativismo de Lady Gaga pode ensinar sobre a importância da empatia e do respeito pelas diferentes vivências das PcDs no dia a dia?
Lady Gaga é uma artista que busca, através de sua arte e sua popularidade, demonstrar e incentivar empatia e respeito pelas diferentes vivências.
Ao falar de seu sofrimento abertamente, a cantora possibilita uma maior visibilidade para as pessoas que também sofrem, sejam com dores físicas ou com deficiências que não podem ser vistas, abrindo assim um espaço de fala sem vitimização.
Gaga, através de seu trabalho, consegue de maneira prática demonstrar princípios de respeito e empatia às vivências de PcDs.
Ao dividir sua condição, fortalece aqueles julgados por suas limitações que não são visíveis.
Além disso, ao falar das dores crônicas e sobre saúde mental, contribui para desestigmatizar os julgamentos ao redor de PcDs, a mostrar a diversidade.
A artista também demonstra com seu ativismo atitudes que fortalecem o movimento por maior inclusão, respeito e empatia para que cada vez mais a sociedade se prepare para integrar e acolher de maneira digna e efetiva quem possui limitações no seu dia a dia, pois inclusão e acessibilidade é direito de todos.