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50+ no mercado de trabalho: inclusão, desafios e soluções

Contratações de profissionais acima dos 50 crescem, mas desafios como o etarismo e a defasagem tecnológica ainda dificultam a reinserção.

A imagem ilustrativa mostra um operário 50+ com capacete nas mãos em uma oficina de fábrica de madeiras e, no fundo, um grupo jovem conversando.

O Brasil registrou, entre 2023 e 2024, um aumento de 8,8% nas contratações formais de profissionais com mais de 50 anos, segundo a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho e Emprego.

O dado representa quase 700 mil novos postos de trabalho preenchidos por esse grupo etário e reforça uma tendência de valorização da maturidade no ambiente corporativo.

Esse crescimento reflete uma valorização crescente da maturidade no ambiente corporativo, com setores como logística, farmacêutico, eletrônico e alimentício liderando as contratações de profissionais seniores. Empresas têm reconhecido qualidades como experiência, responsabilidade e comprometimento nesses trabalhadores, promovendo uma inclusão etária mais ampla no mercado de trabalho.

Além disso, dados da RAIS de 2024 indicam que a faixa etária de 50 a 59 anos acumulou 418,6 mil vagas de emprego formal, reforçando a tendência de aumento na empregabilidade de trabalhadores mais experientes.

Essa tendência não é isolada: dados do Censo Demográfico 2022 do IBGE mostram que o número de pessoas com 65 anos ou mais cresceu 57,4% em 12 anos, passando de 14,08 milhões em 2010 para 22,17 milhões em 2022 — o equivalente a 10,9% da população brasileira.

Já os brasileiros com 60 anos ou mais somam hoje 32,11 milhões (15,6%).

Em contrapartida, o número de crianças de até 14 anos caiu 12,6% no mesmo período e a idade mediana da população aumentou de 29 para 35 anos.

Contudo, os desafios enfrentados pelos profissionais acima dos 50 anos persistem, especialmente o etarismo — preconceito por idade — e a defasagem tecnológica.

A psicóloga e neuropsicóloga Dr.ᵃ Elaine Di Sarno (foto abaixo) destaca os impactos dessa discriminação:

A Dr.ᵃ Elaine Di Sarno ainda é mestre em Ciências pela Faculdade de Medicina da USP e especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental. Crédito: Carlos Alkmin.

“Essa discriminação por idade pode acarretar consequências graves para a saúde e o bem-estar das pessoas idosas. Está associada, por exemplo, à redução da expectativa de vida e ao desenvolvimento de depressão, doenças cardiovasculares e problemas cognitivos. Também aumenta o isolamento social, a solidão e o sentimento de desamparo dos mais velhos, condições que tendem a desencadear problemas de saúde, restringe sua capacidade de expressar a própria sexualidade e aumenta o risco de violência e abusos”.

Ambientes que promovem diversidade etária são apontados como mais saudáveis, produtivos e resilientes.

A trajetória da colaboradora Sandra Regina, assistente de SAC Pleno do Grupo IBL, empresa que atua com transporte e soluções integradas em diversos modais, ilustra bem esse cenário.

Aos 50 anos, a profissional relata uma experiência acolhedora e positiva, que nem sempre reflete a realidade de outros profissionais acima dos 50.

“Falando do meu caso, fui muito bem acolhida pela empresa em que trabalho e pela equipe. Então, mesmo tendo ficado muito tempo sem trabalhar e com essa questão dos 50+, não tive problemas, pois sou bastante dinâmica, acompanho bem o ritmo do pessoal que trabalha comigo e, nesse ponto específico, não tenho do que reclamar quanto à minha vivência. De forma geral, acredito que o que precisa melhorar são as oportunidades para quem está nessa faixa etária”.

A consultora de RH e negócios Lucélia Ourique (foto abaixo) reforça que esse acolhimento e a oferta de oportunidades reais de crescimento fazem parte de um ambiente inclusivo ideal:

Idealizadora do Papo de RH, Lucélia Ourique também integra a Diretoria de Diversidade da ABRH — SC Regional Sul Catarinense e atua como gerente de RH da ProAço. Crédito: Arquivo pessoal.

“O primeiro passo é criar um ambiente verdadeiramente inclusivo, onde o profissional mais experiente se sinta pertencente e respeitado. Isso passa por oferecer oportunidades reais de crescimento, capacitação contínua, especialmente em competências digitais, e criar programas de mentoria reversa, onde o conhecimento é trocado em duas vias. Também é fundamental rever políticas de RH, com foco na diversidade etária, e garantir que os gestores estejam preparados para liderar equipes multigeracionais com empatia e estratégia”.

Apesar do acolhimento pela empresa e pela equipe do Grupo IBL, Sandra relata que um dos principais obstáculos enfrentados após anos fora do mercado foi a defasagem em relação às tecnologias atuais:

“Os maiores desafios que enfrentei para me recolocar no mercado, após 14 anos sem trabalhar, foram a falta de atualização profissional e a ausência dessa percepção. Só me dei conta disso depois que fui contratada pela empresa onde trabalho atualmente. Quando cheguei lá, acreditava que dominava bem o Excel, por exemplo. No entanto, percebi que a ferramenta havia evoluído bastante e eu não havia acompanhado essa transformação. Essa foi a maior barreira, o meu principal desafio. Por outro lado, a experiência prática e didática no atendimento ao cliente permaneceu intacta — isso eu não perdi. Mas o fato de não ter me atualizado em sistemas e programas como Excel, Power BI e dashboards me deixou um pouco insegura no início”.

A Dr.ᵃ Di Sarno comenta como o contato com novas tecnologias pode impactar emocionalmente profissionais seniores, sobretudo em ambientes que não oferecem suporte:

“Alguns fatos associados à inclusão digital mostram que a infoinclusão pode contribuir para uma vida mais longa, digna e com qualidade. O primeiro fato diz respeito ao hiato existente entre a longevidade e o avanço exponencial das tecnologias. Com a inserção das inovações tecnológicas, das interfaces e dos dispositivos digitais, ocorreram modificações na forma de realizar as atividades que fazem parte do cotidiano dos idosos e que exigem dessas pessoas e-skills para garantir a inserção no mundo digital. Porém, os idosos enfrentam dificuldades com a tecnologia devido a diversos fatores, incluindo a falta de familiaridade com dispositivos e aplicativos, medo de cometer erros, preocupações com segurança online e barreiras físicas, como problemas de visão e destreza reduzida”.

Apesar das dificuldades, Sandra Regina reforça que busca atualização constante, especialmente em ferramentas como as mencionadas anteriormente, para acompanhar o ritmo da equipe e tornar mais eficiente o seu dia a dia.

Ourique reforça a importância dessa capacitação constante — inclusive em tecnologias:

“A chave está na personalização dos treinamentos e na forma como se comunica o valor dessas iniciativas. É importante oferecer capacitações que respeitem o ritmo de aprendizado de cada faixa etária, usando linguagens acessíveis e formatos variados. Mais do que isso, é preciso mostrar que inovação não é exclusividade dos mais jovens, ela nasce da curiosidade e da troca. Ao unir a experiência de quem já passou por muitos ciclos com as novas ferramentas e metodologias, criamos soluções mais completas, humanas e sustentáveis”, conclui a consultora de RH e negócios.

Para Sandra Regina, a sua experiência acumulada ao longo dos anos também contribuiu para o clima organizacional e para a resolução de conflitos no atendimento ao cliente.

“Enxergo minha contribuição como positiva. Isso porque tenho mais experiência, mais paciência e dinamismo para resolver conflitos. O pessoal mais jovem, a chamada Geração Z, tem uma forma diferente de agir, não possui experiência em tratativas e, quando surge algum imprevisto com parceiros de outros estados, muitas vezes não tem a melhor técnica para negociar e demonstra falta de paciência para resolver. Por isso, acredito que minha experiência nesse campo tem um peso significativo. Tanto que continuo na empresa até hoje”.

E é justamente esse equilíbrio entre gerações que Lucélia aponta como uma vantagem competitiva:

“Valorizar a diversidade etária é uma decisão inteligente e estratégica porque amplia a visão das equipes, une experiências diferentes e promove mais equilíbrio nas decisões. Profissionais com mais de 50 anos trazem bagagens valiosas, estabilidade emocional e habilidades interpessoais amadurecidas, algo que complementa muito bem o dinamismo das gerações mais jovens. Essa troca intergeracional favorece a inovação com responsabilidade, e isso se reflete diretamente nos resultados da empresa e na construção de uma cultura mais sólida e inclusiva”.

Diante disso, a Dr.ᵃ Elaine reforça que, “diante dos impactos da transformação digital, é muito importante que sejam adotadas políticas públicas para facilitar a inserção dos idosos numa sociedade que está cada vez mais dependente da tecnologia”.

Num país que envelhece rapidamente, realizar ações afirmativas, criar programas de requalificação e implementar políticas públicas inclusivas são estratégias essenciais para garantir um mercado de trabalho mais justo e preparado para o futuro.

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