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Passou da hora das mulheres negras terem maior representatividade no mercado de trabalho

Débora Montibeler, consultora de projetos em diversidade na Blend Edu (startup responsável por promover a diversidade em empresas), escreve artigo sobre a necessidade das mulheres negras possuírem maior representatividade no ambiente corporativo.

Crédito: Divulgação/Blend Edu

Nos últimos anos, a equidade de gênero e raça são alvos de múltiplos debates dentro do mercado de trabalho.

No primeiro caso, especificamente, é consenso que as mulheres estão conseguindo maior espaço no ambiente corporativo até mesmo pela necessidade das empresas adotarem práticas ligadas à agenda ESG em seu modelo de negócio.

Porém, é preciso entender quais são as mulheres beneficiadas pelas ações ligadas à pauta de gênero nas organizações.

Um olhar mais atento para a demografia das empresas revela o quanto ainda é necessário direcionarmos esforços, de forma mais atenta, para as demandas das profissionais negras.

Dentro do ambiente de trabalho, as mulheres negras ainda enfrentam uma série de desafios que impactam seu ingresso, permanência, progressão e oportunidades de carreira.

Entre janeiro e março deste ano, por exemplo, das quase 49 milhões das mulheres negras que possuem idade para trabalhar, apenas pouco mais da metade delas estavam inseridas no mercado de trabalho (51,2%).

Entre os homens brancos e amarelos, essa taxa é de 72,2%.

Esses números foram divulgados por uma pesquisa da FGV, que usou como base dados do IBGE.

Há de se destacar que mesmo quando conseguem superar todas as adversidades, elas ainda acabam convivendo com a questão da desigualdade salarial.

De acordo com o levantamento divulgado pelo IBGE em 2021, a média de rendimento mensal de uma mulher negra é de R$ 1.471.

O montante é 42% inferior em comparação às mulheres brancas.

Já em relação aos homens brancos, o índice de disparidade chega a 57%.

Para se ter uma dimensão do problema, a cada real ganho por um homem branco, uma mulher negra recebe somente R$ 0,43.

Esse panorama de desigualdades acaba sendo refletido também na flagrante escassez de mulheres negras nos cargos de liderança.

Para se ter uma ideia, mesmo representando 28% da população brasileira (IBGE, 2018), somente 1,3% delas comandam equipes nas empresas nacionais, segundo dados revelados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Mais do que gerar uma ausência de modelos inspiradores para aquelas que almejam ascensão profissional, essa realidade cria um ciclo vicioso no qual as mulheres negras não se veem projetadas nos modelos que ocupam e os espaços de poder acabam por se afastar ainda mais.

Diante de todos esses números e dados, fica evidente que a temática da equidade racial e de gênero, enquanto marcadores combinados, ainda está muito mais atrelada ao campo das ideias do que realmente uma atuação concreta das empresas.

Tudo isso impacta as mulheres negras duplamente, colocando-as em uma posição de maior vulnerabilidade na estrutura social, dada a experiência de cruzamento e sobreposição das opressões de raça e gênero.

Com isso, suas demandas e necessidades acabam sendo invisibilizadas e suplantadas pelas necessidades de outros grupos que ocupam o espaço corporativo.

Todo esse cenário reitera a necessidade de que esse problema seja reconhecido quanto antes e que os desafios sistêmicos sejam abordados de forma a criar um ambiente de trabalho mais inclusivo, equitativo e diversificado.

Ações afirmativas, vagas e ações de desenvolvimento voltadas especificamente para esse público, além da construção de culturas organizacionais que, de fato, nutram segurança psicológica e pertencimento em suas colaboradoras, são alguns dos pontos que precisam ser ajustados nas companhias.

Outras ações importantes podem ser o estabelecimento de metas e compromissos públicos com a pauta. Algumas empresas, por exemplo, têm definido estratégias para aumentar a participação e a representação de mulheres negras em cargos de liderança.

Esse tipo de resolução ajuda a direcionar os esforços e garantir a transparência na busca pela igualdade de oportunidades.

Todos esses movimentos são fatores essenciais para a construção de uma base de atuação que seja, concomitantemente, antirracista e antimachista e que pondere a interseccionalidade dentro do mercado de trabalho.

Vale ressaltar, no entanto, que a realização de ações afirmativas não deve ficar restrita  à abertura de vagas para o ingresso de mulheres negras nas organizações, mas ao desenvolvimento de um comportamento ativo das instituições no sentido de garantir, fomentar e propiciar a igualdade em todos os pontos de contato dessas mulheres nas organizações, por meio de uma agenda de equidade.

A realidade, infelizmente, ainda coloca as mulheres negras na base da pirâmide salarial do nosso país.

A desigualdade, cada dia mais evidente em diferentes frentes, acaba por afetar negativamente a estabilidade financeira dessas profissionais, dificultando sua ascensão econômica e mobilidade social.

A aplicação de um olhar interseccional é o começo e precisa ser tratada com urgência pelo mercado corporativo num todo.

Fato é que a inclusão de mulheres negras não pode ser considerada através da lente de gênero apenas, nem somente pela lente de raça, mas pela combinação de ambos os fatores.

Por fim, é preciso celebrar e honrar a trajetória de mulheres negras na sociedade brasileira, abrir espaço para poderem manifestar toda a sua potência e para que suas vozes sejam ouvidas.

Os desafios enfrentados por elas são grandes e estão relacionados à sua dupla sub-representação, o que acrescenta requintes de complexidade à sua condição.

Porém, se nós, enquanto sociedade, assumirmos o compromisso com a visibilização de suas pautas e com a produção de mais equidade, a presença e permanência desse grupo nos espaços de decisão trará benefícios para todas as pessoas.

Até porque a balança social será realmente equilibrada quando houver um espaço seguro e um ambiente em que a diversidade é colocada em prática de maneira genuína.

Mais da autora

Débora é uma das principais especialistas em diversidade e inclusão do Brasil, além de ser responsável por auxiliar as empresas parceiras da Blend Edu na implementação e sustentação das estratégias de D&I.

Por fim, também é TEDx Speaker, membro da Associação Pacto de Promoção da Equidade Racial, do Conselho Consultivo da UNESCO-SOST Transcriativa e atua no EUCONECTO, movimento que surgiu para conectar mulheres com espírito empreendedor.

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